sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Gastronomia - Algumas anotações pontuais ao texto do projeto de pesquisa sobre Culinária Nortista * - Pedro Vicente Costa Sobrinho


No seu texto de apresentação ao projeto de pesquisa sobre Culinária Nortista, a autora argumenta que existe pouca divulgação no que diz respeito à culinária da Amazônia; todavia, esse fato pode até estar ocorrendo em decorrência da falta incisiva, em particular, da presença dessa culinária na mídia televisiva, mesmo considerando que a Amazônia nesses tempos de ecologia banalizada tem sido a região com maior exposição na mídia nacional e internacional: rádio, televisão, internet e impressa. No entanto, se essa escassez de divulgação casualmente existir, não pode ser de modo algum atribuída à falta de estudos e publicações clássicos sobre sua flora e fauna alimentares. Então vejamos: a) No Brasil, a região da Amazônia é a que melhor dispõe de estudos sobre suas frutas comestíveis, anote-se: Coleção Adolpho Ducke - Frutas Comestíveis da Amazônia, autor Paulo B. Cavalcante, já na sexta edição. No livro o autor arrola aproximadamente mil frutas comestíveis, quase que um censo, além de compulsar uma bibliografia de referência com cerca de 50 títulos; b) no que diz respeito à publicação de livros sobre alimentação e culinária destacam-se por sua relevância pelo menos três clássicos: Panorama da alimentação indígena: comidas, bebidas... tóxicos na Amazônia brasileira, de Nunes Pereira; Cozinha Amazônica, de Osvaldo Orico; e ainda o belíssimo livro de Leandro Tocantins "Santa Maria de Belém do Grão Pará. Mais recentemente, a Editora do SENAC Nacional publicou em edição primorosa o livro "Culinária Amazônica: o sabor da natureza, organizada por Raul Lodi. No que se relaciona ao Acre, na década de 1980, publicou-se em edição mimeografada uma pesquisa sobre culinária regional, feita por alunos do curso de pedagogia da UFAC, sob minha orientação. Há ainda um considerável número de publicações em livros, plaquetes etc., e também em jornais e revistas com receitas e informações alimentares e culinárias sobre a Amazônia.

Na parte do texto sob a forma de Introdução - é necessário que a autora se preocupe em alargar e aprofundar suas referências, pois muitas questões ainda precisam ser melhor explicitadas. Por exemplo: a) a maniçoba não é um prato típico por excelência do Pará, pois é largamente produzido e consumido no Recôncavo Baiano e também no município de Feira de Santana, inclusive mereceu ser catalogada com sua respectiva receita por Darwin Brandão, no seu clássico "Cozinha Baiana"; b) o fruto bacuri, por sua vez, foi introduzido no cardápio do Itamaraty desde os anos de 1900 pelo ministro Barão do Rio Branco, como sobremesa sob a forma de compota ou geléia; c) o guaraná é conhecido no mundo inteiro, com formas de apresentação comestível muito diversificada, e mais recentemente associado ao açaí; c) A graviola, por sua vez, circula em todo Brasil e em países fronteiriços, porém a sua presença no mercado é bem mais restrita em decorrência da efetiva falta de produção agrícola-industrial.

Quanto ao curioso registro que a autora faz com relação a existência de duas mil espécies de peixes possivelmente encontradas na Amazônia, é preciso que essa referência seja melhor  explicitada, pois, na sua grande maioria, são peixes considerados ornamentais, e, portanto, sem aproveitamento alimentar ou gastronômico. Pesquisas mais recentes catalogam para todo o Brasil 100 a 200 espécies comestíveis com viabilidade de produção industrial, inclusive marinhas. Segundo Nunes Pereira: "Luiz Agassiz, cientista suíço-americano, declarou ter encontrado na Amazônia mais de mil e duzentas espécies de peixes comestíveis. Apreciando essa declaração, a crítica científica afirmou que ela fora exagerada, não correspondendo, de modo nenhum, à realidade. Segundo uma conhecida expressão germânica, caracterizadora de um desajustamento dessa realidade com um fato ou um objeto, Agassiz teria "escrito com um garfo". Por sua vez, no que diz respeito às ervas e temperos acreanos, eu confesso não haver encontrado nenhum diferencial digno de registro na pesquisa realizada por alunos de pedagogia da UFAC, sob minha orientação.

No que diz respeito no projeto aos seus objetivos e resultados arrolados para serem perseguidos ou alcançados, eu considero que merecem certo ajuste, pois são muito largos e ambiciosos para uma pesquisa e obra de elaboração individualmente concebida. E para concluir, considero de bom alvitre que sejam feitas alterações importantes no projeto com vistas a delimitar bem o objeto que se pretende estudar.
.
*Culinária Nortista – Projeto de pesquisa de Francineide Pinheiro Said Maia

Nenhum comentário: